Esquema de policiais em Roraima facilitava venda ilegal de armas para garimpeiros, apontam investigações da PF
As investigações da Polícia Federal que desencadearam duas operações em Roraima nesta quarta-feira (23) apontam que um esquema de venda ilegal de armas no Estado beneficiavam diretamente garimpeiros, os quais eram os principais compradores.
Entre os alvos da PF, estão o comandante-geral da Polícia Militar de Roraima, coronel Miramilton Goiano, e o deputado estadual e policial penal Rarison Barbosa (PMB).
O esquema envolvia policiais penais, além de um policial civil, que negociavam armamentos e munições de forma clandestina, utilizando o WhatsApp como principal canal de comunicação.
O caso teve origem na Operação Alésia, deflagrada em 2020, que inicialmente investigava o favorecimento de uma facção criminosa dentro do sistema prisional de Roraima.
Embora as investigações sobre o comandante da PM e o deputado não estejam diretamente ligadas à venda de armas para garimpeiros, ambas as operações são desdobramentos das apurações feitas a partir da Alésia. Foram cumpridos 16 mandados de busca e apreensão nesta quarta-feira.
O esquema funcionava com dois policiais penais liderando a compra regular de munições em lojas autorizadas, que depois eram vendidas a garimpeiros, considerados os melhores clientes devido ao alto lucro gerado.
Outros membros do grupo criminoso eram responsáveis por negociar as armas através do WhatsApp, atraindo principalmente garimpeiros em busca de armamento para proteger suas atividades ilegais de mineração em áreas isoladas da Amazônia.
Organização criminosa
Investigações das polícias Civil e Federal apontam para uma organização criminosa formada por agentes da Polícia Militar de Roraima acusados de cometerem diversos crimes e atuarem como milícia privada no Estado.
A fim de intimidar invasores que extraem ilegalmente ouro e cassiterita na Terra Indígena Yanomami, o grupo pratica extorsão e roubo de toneladas de minérios para ficar com o lucro, além de vender proteção e armamentos aos garimpeiros. Mais de 40 policiais militares estariam envolvidos em diversos atos ilícitos, segundo reportagem do jornal O Globo.
Entre os citados por testemunhas ouvidas pelas autoridades, está o atual comandante-geral da PMRR, Miramilton Goiano de Souza. Em nota, ele diz que as suspeitas “são inverídicas, sem fundamentos e não se sustentam quando colocadas diante dos mais de 34 anos na corporação”.
Documentos obtidos pela reportagem revelam que policiais da ativa se uniram a criminosos para realizarem roubos, extorsões, torturas e execuções de garimpeiros, além de assassinatos sob encomenda ligados à disputa por terras em Roraima.
O esquema ainda oferece, de acordo com as investigações, serviços de segurança, escolta e munições a outros grupos de invasores que trabalham no garimpo, além de coletes à prova de bala. As autoridades também apuram a participação dos integrantes do bando no transporte de cocaína na fronteira com Venezuela e Colômbia por meio de aeronaves.
As investigações sobre a constituição de milícia por parte de policiais militares tiveram início em setembro de 2022, quando oficiais da ativa participaram de uma desastrada tentativa de roubo de um avião, usado em viagens para garimpos localizados na terra indígena e de propriedade de Efraim Hadan Abreu da Silva, o “Smith”, segundo aponta o inquérito de número 3027/2022, com 1.006 páginas, da Polícia Civil de Roraima, ao qual a reportagem teve acesso.
Coronel foi visitar investigado pela PF
Em outra investigação para desarticular uma facção criminosa com base na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (Pamc), na zona rural de Boa Vista, desta vez da Polícia Federal, o nome do coronel Miramilton volta a figurar em relações suspeitas. Um dos investigados pela PF é o agente penitenciário Renie Pugsley de Souza, filho do atual comandante-geral da PM.
Os dois teriam feito ao menos três visitas irregulares ao interno Jonathan Novaes de Almeida, preso na Operação K’daai Maqsin, de 2019, que investigou uma organização responsável por vender armas e munições ilegalmente para garimpos e facções criminosas. Segundo a PF, Renie de Souza, que usava uma balaclava nas visitas, não estava lotado na unidade prisional e seu pai não apresentava vínculos com a Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania (Sejuc).
Antes de ser preso, Jonathan Noaves de Almeida chegou a trabalhar no Centro de Formação de Vigilantes de Roraima, administrado pelo coronel Miramilton, de acordo com a PF. No momento, a empresa de segurança consta como inativa na Receita Federal. A investigação da PF apontou que o filho do coronel mantinha uma elevada movimentação financeira em suas contas bancárias, apesar de receber na época R$ 4 mil de salário.